O gerenciamento de projetos vem passando
por grandes mudanças ao longo dos últimos anos, numa tentativa, penso eu, de
aumentar a probabilidade de sucesso dos projetos. E, sem dúvida, isso é fácil
de falar, mas difícil de realizar.
Aqueles que adotam o Guia PMBOK (até a
versão 6) no seu dia a dia como sua fonte de verdade acham essa afirmação um
tanto exagerada. De modo geral, para este grupo, uma boa execução depende de um
bom e amplo planejamento que contemple de forma adequada as dez áreas de
conhecimento detalhadas no referido Guia do PMI [Project Management Institute].
Além disso, o ciclo de vida de um projeto pode ser muito bem representado pelas
fases de iniciação, planejamento, execução – e dentro da execução se deve
controlar e monitorar o andamento do projeto - e, finalmente, a fase de
encerramento. Este tipo de abordagem tem sido adotado pelas organizações que
trabalham com projetos de longa duração (muitos meses), com equipes grandes,
com atividades que possuem muitas dependências entre si, além de orçamentos na
casa dos milhões. Será que, por exemplo, a moderníssima Tesla toma a decisão
sobre investir em um projeto para desenvolver um novo veículo espacial, de
milhões de dólares, sem um business case e um plano? Eu creio que não. São
projetos que podem ser subdivididos em etapas, mas o produto de cada etapa não
pode ser considerado como um produto mínimo viável que pode ser usado ou
consumido pelos clientes. Um prédio só se torna um produto após o término de
sua construção. Os alicerces não são um produto. As paredes de alvenaria não
são um produto. O estacionamento não é um produto. O telhado não é um produto.
Somente o prédio pronto é um produto que pode ser usado por seus compradores.
Da mesma forma isso se aplica a automóveis, aviões de passageiros, tratores,
satélites, túneis, poços de petróleo e veículos espaciais. Estes só se tornam
produtos viáveis quando seus projetos são totalmente concluídos. No entanto, vários
dos princípios ágeis podem ser adotados nestes projetos, melhorando a
comunicação, o trabalho colaborativo e muitos outros aspectos, mesmo que não
sejam criados produtos mínimos viáveis ao longo do projeto.
Já aqueles que trabalham com métodos
ágeis no seu dia a dia também sentem que todo o barulho sobre as mudanças no
gerenciamento de projetos reflete certo exagero. Para este grupo, que vive nas
bolhas digitais, tudo funciona perfeitamente bem dentro dos sprints, num mundo
que deve seguir as prescrições do método ágil adotado, com reuniões diárias de
pé, sempre no mesmo horário e local, fazendo estimativas usando, por exemplo, o
planning poker, não aceitando mudanças de escopo durante um sprint, respeitando
o poder de decisão do product owner e as orientações do scrum máster como uma
espécie de guru. Sim, eu dei o exemplo do método Scrum, por ser este o mais utilizado no planeta. Mas, antes que alguém diga, não estou
criticando os métodos ágeis, muito pelo contrário. Estou apenas buscando fazer
uma análise fria sobre este tema. Apesar
do conceito de agilidade transbordar para várias áreas nas organizações, tudo
começou na área de TI com o desenvolvimento de software. Apenas para
exemplificar, vale mencionar que várias organizações foram bem sucedidas
adotando os princípios da agilidade na gestão de projetos de desenvolvimento de
software. Uma pesquisa de Donald Reifer, publicada em 2017, confirmou
a eficácia dos métodos ágeis, com melhorias de 7% a 12% nos ganhos médios de
produtividade.
Ainda para colocar mais lenha nessa
fogueira, muitos especialistas concordam que a agilidade, quando aplicada em
escala, necessita de estruturas de trabalho específicas – os tais frameworks –
para que possa ser bem empregada em projetos de maior porte, com equipes
grandes e de longa duração. Os métodos ágeis convencionais, como
o Scrum e o XP (eXtreme Programming), não fornecem orientação
suficiente em aspectos que são relevantes para uma grande empresa como, por
exemplo, alinhamento de processos internos e gestão de riscos. E nessa linha
temos o SAFe (Scaled Agile Framework), o framework ágil em escala mais adotado
nas empresas até esse momento. Por sua vez, o PMI promove o Disciplined Agile
(DA), criado por Scott Ambler quando trabalhava na IBM/Rational em 2009 e,
depois de algum tempo, adquirido pelo PMI em 2019.
Não menos importante é o movimento de
integração de tecnologias de Inteligência Artificial e outras tecnologias
disruptivas à gestão de projetos. Um relatório do PMI identifica seis tecnologias com maior potencial de impacto no trabalho dos
gerentes de projetos: aprendizado de máquina (machine learning), aprendizado
profundo (deep learning), automação robótica de processos (RPA ou Robotic
Process Automation), gerenciamento de decisão, sistemas baseados em
conhecimento e sistemas especialistas.
Mas porque todo esse esforço? Para mim a
resposta dessa pergunta está no primeiro parágrafo desse artigo. É ainda um
desafio para as organizações em todo o planeta aumentar a probabilidade de
sucesso dos projetos. Uma forte evidência é que a taxa de
sucesso dos projetos é ainda baixa. Há dados sobre esse fenômeno em muitos sites que
podem ser facilmente acessados. Para trazer algo novo, encontrei um texto publicado
em fevereiro de 2022 pela empresa Monday, um conhecido fornecedor de ferramentas
de software dedicadas ao trabalho em equipe e a gestão de projetos, com o
seguinte título: 24 project management statistics you don’t want to miss in 2022 (24 estatisticas de gerenciamento de projetos que você
não pode perder em 2022).
Os dados apresentados nesse texto
afirmam que as demandas sobre os gerentes de projeto estão aumentando, mas,
infelizmente, os sistemas de gerenciamento de projetos não estão amadurecendo
na mesma proporção. Apenas 46% das organizações fazem do gerenciamento de
projetos uma prioridade cultural. Portanto, a maturidade do gerenciamento de
projetos não é valorizada. Em todas as organizações, 11,4% de todos os recursos são desperdiçados devido a
processos de gerenciamento de projetos inferiores. As pesquisas sugerem
que as organizações que não integram adequadamente o gerenciamento de projetos
em suas estratégias verão sua taxa de insucesso de projeto aumentar em um fator de 2/3. Apenas 43% das empresas relataram que “na maioria das vezes” ou
“sempre” concluem seus projetos dentro do orçamento estabelecido. Orçamentos mais altos estão correlacionados
com uma maior taxa de insucesso. A pesquisa revela que gastar
mais em um projeto pode significar que é mais provável que ele
falhe. Projetos em que a empresa gasta US$ 1 milhão ou mais falham com 50% mais frequência do que projetos em que US$
350.000 ou menos são gastos. As empresas que constroem práticas de projeto
sólidas desfrutam de uma série de benefícios. Em comparação com empresas sem
processos maduros de entrega de valor, elas têm maior probabilidade de atingir suas metas de projeto (77%
vs. 56%), permanecer dentro do orçamento (67% vs. 46%) e entregar no prazo (63%
vs. 39%), e menos propensos a sofrer com mudanças descontroladas do escopo (30% vs. 47%) ou falha
total do projeto (11% vs. 21%).
Portanto, não adianta viver e trabalhar com
base em dogmas, métodos prescritivos e receitas de bolo que supostamente
funcionam bem em qualquer situação. O bom senso manda fazer uma reflexão
honesta sobre cada situação, buscando iluminar as áreas cinzentas que
prejudicam uma tomada de decisão realmente adequada. Feito isso, podemos
decidir o que fazer. Quanto mais estivermos preparados, quanto mais
conhecimento tivermos ao nosso alcance, melhor será o resultado de nossa
análise.
Os projetos são sistemas complexos com múltiplos
fatores que podem influenciar seu resultado. Mesmo o menor dos projetos está
sujeito aos impactos causados por uma vasta rede de relações de causa e efeito.
Se imaginarmos como ponto de partida o resultado que o projeto entrega, este é
influenciado pelo desempenho das pessoas (com cooperação e trabalho em equipe),
pelo conhecimento (dominando todos os aspectos necessários e relevantes para o
projeto) dos membros dessa equipe e da sua assertividade (fazer as escolhas certas
e mais adequadas), pelo desempenho nos negócios da organização executora do
projeto (se a organização é bem sucedida, inovadora, está crescendo, isso ajuda
ao projeto) e pela cadeia de suprimentos da organização executora do projeto
(por obter vantagens de custo e logística, aumentando as chances de sucesso do
projeto). Por sua vez, o desempenho das pessoas é influenciado pelo ambiente
interno da organização, pela política, por seu bem estar e situação econômica
na sociedade. Já o desempenho nos
negócios de uma organização depende fortemente dos mercados em que atua e do
comportamento dos consumidores. E, na mesma medida, o comportamento dos
consumidores depende também do mercado e do custo dos bens e serviços. Ainda
dentro desse raciocínio, podemos dizer que o custo dos bens e serviços depende
dos mercados, do ambiente interno das organizações e da política. Evidentemente isso não é tudo, sendo possível adicional outros fatores de influência aos aqui apresentados e destacados na figura que está no início desse artigo. Mas, como para bom entendedor meia palavra basta, creio que já me fiz entender
Querendo ou não, esse é o mundo em que vivemos e é neste mundo que os projetos são feitos! A busca por conhecimento nunca é demais. Na verdade ela é absolutamente necessária se quisermos entender o que se passa a nossa volta. É o que nos fortalece e nos ajuda a pensar com nossas próprias cabeças. Portanto, antes de sair acreditando em teorias mirabolantes e métodos infalíveis apresentados de forma açucarada na propaganda de A ou de B, procure verificar os fatos. Ver o que é cada coisa e analisar os resultados concretos. Procure entender o que pode ser aplicado em cada situação e se uma ideia, não importando o carimbo a ela atribuído, pode realmente ajudar o seu projeto. É isso aí, até a próxima!
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