Os
processos de gerenciamento de projetos são apresentados como elementos
distintos com interfaces bem definidas. Entretanto, na prática eles se
sobrepõem e interagem e, por isso mesmo, é tão relevante a integração do
projeto! No PMBOK guide é possível encontrar uma importante área chamada “Gerenciamento
da Integração do Projeto”, cujo primeiro processo é o de “Desenvolver o Termo
de Abertura do Projeto”.
A
designação Termo de Abertura do Projeto é a tradução ou a versão para o nosso
idioma da expressão “Project Charter”, cunhada na versão original do PMBOK
guide, em inglês.
Como
dissemos anteriormente, a natureza integrativa do gerenciamento de projetos faz
com que os processos interajam uns com os outros. Na prática, para entender como esta interação
acontece em uma empresa precisamos conhecer o jeito como as coisas funcionam –
suas rotinas e processos (estando estes descritos / documentados ou não) - na
organização. Em empresas diferentes podemos ter processos diferentes, culturas
diferentes e níveis de maturidade diferentes em relação à gestão de projetos.
Por conta disso, essa interação dos processos de gerenciamento de projetos pode
ser diferente de empresa para empresa. Por isso, os gerentes de projeto mais
experientes reconhecem que é necessário pensar antes de agir e que as coisas
podem não funcionar exatamente como se espera ou se entende ao ler o PMBOK
guide! Então, botando a cabeça para funcionar vamos, nesse post, fazer algumas
reflexões sobre o chamado Termo de Abertura do Projeto, cujo desenvolvimento faz
parte dos processos de integração do projeto.
Quando
elaboramos o Termo de Abertura do Projeto, o que fazemos é desenvolver um
documento que formalmente autoriza a existência de um projeto e dá ao gerente
de projeto a autoridade necessária para aplicar recursos organizacionais às
atividades do projeto.
Mas
será que um projeto realmente começa pra valer a ser executado depois da
emissão do termo de abertura? Esta parece ser a conclusão de muitos estudantes
de gerenciamento de projetos. Afinal de contas, o “Project Charter” descreve
o produto ou serviço que o projeto se propõe realizar e a necessidade que o
projeto visa atender, incluindo a justificativa para a existência do projeto,
sempre respaldado pelo alinhamento com o plano estratégico da organização. Dada
a importância desse documento, deve ser criado e assinado pelo patrocinador
(sponsor) do projeto, que é um gestor que está em um nível superior na escala
hierárquica da organização.
Mas,
insistindo na pergunta, será que conseguimos executar um projeto tendo apenas o
termo de abertura? Bem, à rigor, a resposta a essa pergunta é não. Para
executar um projeto é necessário primeiro planejar o mesmo. Mas, não devemos
esquecer que esse planejamento dá um certo trabalho e, sem nenhuma dúvida, já
gasta tempo, dinheiro e recursos da organização. Sim, mas é justamente para
isso que serve o Termo de Abertura do Projeto. Com ele, temos a autorização
para aplicar recursos organizacionais às atividades do projeto. A necessidade
do planejamento é óbvia, mas não podemos esquecer que o Termo de Abertura do Projeto
tem informações em alto nível, que é uma tradução da expressão inglesa “high
level”, mas que significa em bom e claro português, alguma coisa sem
detalhamento. Portanto, parece lógico não ser possível executar um projeto
apenas com informações não detalhadas (o tal “high level”), sendo necessário
antes trabalhar no planejamento do projeto.
Aí
entra a seguinte questão: como a empresa autorizou um projeto tendo apenas
informações não detalhadas? Não haveria um risco muito grande de cometer erros
nas estimativas e estar considerando dados não confiáveis? Sim, e não, como
veremos no decorrer desse post! Bem, nesse ponto considero que já foram criadas
dúvidas suficientes e é o momento de por ordem na provável bagunça.
Em
primeiro lugar, para emitir o Project Charter (Termo de Abertura do Projeto) é
necessário ter primeiro aprovado o projeto. Esse é o ponto no qual a
organização diz o seguinte: - “Okay, vamos fazer esse projeto”. Para chegar a
essa conclusão, a empresa deve ter analisado a importância do projeto do ponto
de vista dos benefícios que o mesmo traz para a organização (aumento de
receita, expansão da capacidade produtiva, adequação de sistemas de informação
à legislação vigente, otimização de processos, dentre muitos outros). Um “business
case” costuma ser elaborado para servir de base de discussão sobre o projeto, apresentando
os argumentos para sua aprovação, com detalhes sobre os investimentos no
presente e as receitas no futuro, além de uma clara explicação sobre - quanto
será, quando e como a empresa obterá - o retorno sobre o investimento.
Um
projeto devidamente aprovado ainda precisa receber o sinal verde para iniciar a
sua execução. Então, temos agora uma segunda decisão a tomar!
Há
empresas que podem tomar essa segunda decisão – de iniciar a execução do
projeto - usando estimativas não detalhadas (presentes no Termo de Abertura do
Projeto), por possuírem dados históricos de outros projetos e a experiência do
dia a dia que mostra um erro muito pequeno entre suas estimativas e os números
dos projetos reais que implementam. A etapa de planejamento, que levará em
conta a experiência acumulada das lições aprendidas, será bem mais rápida nesse
caso.
Vamos
citar, apenas para exemplificar, o caso hipotético de uma construtora de
prédios residenciais que faz esses prédios ano após ano. Ela conhece o projeto
arquitetônico e de construção civil de seus empreendimentos e o custo de tudo
ou quase tudo na obra por metro quadrado (mão de obra, materiais, máquinas e
instrumentos utilizados). Essa empresa conhece muito bem a sequência de
atividades de seus projetos, bem como as durações de cada atividade. Além
disso, essa empresa domina as técnicas empregadas no seu ramo de negócio. Isso lhe dá uma segurança muito grande e reduz
o risco do projeto. Essa empresa notou que nos últimos 10 edifícios construídos,
a diferença entre real e planejado com relação as estimativas de custo e de
prazos de conclusão das obras, foi menor do que 10%. Em outras palavras, quando
uma empresa desse tipo faz uma estimativa, costuma cometer um erro pequeno e
previsível.
Agora,
vamos pensar em outro tipo de empresa, do tipo que precisa de mais detalhes
para dar o sinal verde para iniciar a execução de um projeto previamente
aprovado. Nesta ainda temos um “business case” que se mostrou bastante
promissor, para um projeto que abrange várias áreas em que não há um domínio
pleno por parte dessa empresa. Para a elaboração desse “business case” foi
previsto um orçamento, foi estimado um prazo e definida a necessidade dos
recursos, tudo isso relacionado ao projeto. Mesmo assim, ainda há muitas
dúvidas. E não é difícil imaginar que tipo de empresa seria essa. Uma fábrica,
por exemplo, que é especializada na produção de algum tipo de peça e usa um
grupo de máquinas, conhece muito bem seus processos produtivos e a aplicação
das peças que produz. Como qualquer organização, a empresa é especialista
naquilo que faz! Entretanto, não é uma especialista na instalação e manutenção
das máquinas que utiliza em suas linhas de produção. Se, por exemplo, existe um
projeto de expansão de uma de suas linhas de produção, será necessário buscar
novas máquinas com os fornecedores, fazer adequações na fábrica, descrever
processos, elaborar rotinas de trabalho, contratar e treinar pessoal, além de
muitos outros detalhes. Essas seriam as áreas nas quais não há pleno domínio,
sendo necessário buscar mais elementos, necessários para a tomada de decisão. Essa
realidade aumenta o risco do projeto e o tempo de planejamento do mesmo. Por
conta disso, para essas organizações torna-se necessário levantar dados e
informações sobre o projeto e realizar um planejamento inicial que dê elementos
mais sólidos para que a direção da empresa possa realizar essa tomada de
decisão. Tudo se passa como se nessas empresas fosse necessário antecipar uma
parte do trabalho de planejamento, o suficiente para ter em mãos certos
elementos vitais do futuro projeto como, por exemplo, a EAP, o orçamento e o
cronograma do mesmo. Obviamente, dentro de um tempo determinado, isso é feito
em várias rodadas, debatendo diferentes alternativas e opções, até encontrar a
melhor versão de planejamento possível. Portanto, após esse trabalho, é obtido
o melhor planejamento inicial possível do projeto, alguma coisa com um nível de
detalhamento superior ao encontrado no Termo de Abertura do Projeto.
Muito
bem! Nesse ponto podemos fazer o seguinte questionamento: - E se, após ter sido
obtido o melhor planejamento inicial possível do projeto - for verificado que o
orçamento excede o valor previsto inicialmente, o prazo é maior do que o
estimado e haverá uma necessidade de recursos acima do que tinha sido definido
na época do “business case”? Mais uma vez, haverá respostas diferentes para
empresas diferentes. Em algumas empresas a direção forçará o projeto
a trabalhar com os números inicialmente previstos, mesmo que o melhor
planejamento inicial esteja dizendo que isso não é suficiente. Infelizmente,
devido a arrogância de muitos chefes, essa não será uma decisão de poucas
organizações. Outras empresas solicitarão ao gerente de projetos que reveja
seus números, colocando até um pouco de pressão para que esses números (custos,
prazos, recursos) se alinhem com as previsões iniciais, mas respeitarão os
números finais obtidos pelo gerente de projetos. Sendo assim, se houver
recursos disponíveis na empresa o projeto seguirá em frente, com as
modificações definidas pelo planejamento inicial. Caso não haja dinheiro,
pessoal disponível e tempo, o projeto será engavetado, até segunda ordem.
Afinal uma decisão dura, mas muito honesta.
Bem,
foi possível notar que houve uma armadilha gerencial no caso anteriormente
apresentado. Para não cair nessa armadilha, muitas empresas entenderam que,
antes de emitir o Termo de Abertura do Projeto – que pertence a etapa de
iniciação do projeto – precisam também obter o melhor planejamento inicial do
projeto, mesmo que esse não pertença formalmente aos processos de iniciação do
projeto.